Na entrevista de hoje da série “Vozes do ESG”, conversamos com Camila Novaes, diretora de Marketing da Visa. Com mais de 20 anos de experiência, a executiva se destaca por promover transformações significativas no ambiente corporativo, com ênfase em inclusão e responsabilidade social.
Listada como uma das profissionais negras que promovem a transformação digital em grandes corporações pela Revista Forbes, Camila é responsável por desenvolver estratégias de Marketing para emissores da Visa e já foi responsável pela estratégia de comunicação da marca em Mobilidade Urbana.
Camila também é Líder do Comitê de Inclusão & Diversidade da empresa, focando nas frentes de raça, gênero, PcD e LGBTQIA+. O comitê aplica práticas e políticas com foco em conscientização, inclusão e responsabilidade social, desde a mudança cultural e letramento dos funcionários até projetos como o Programa de Estágio para profissionais negros.
Antes da Visa, Camila trabalhou na área de marketing de empresas como Sony Mobile, Cielo, Sony do Brasil e White Martins. A executiva é formada em Relações Públicas, Publicidade e Comunicação Aplicada pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho.
A seguir, confira a íntegra desta conversa inspiradora com Camila Novaes, que compartilhou sobre sua trajetória, seu papel de liderança e como a Visa integra as práticas de ESG em suas estratégias corporativas.
1) Como você integra as estratégias de diversidade e inclusão nas campanhas de marketing da Visa, especialmente em relação a grupos sub-representados?
Para criar uma conexão genuína, é primordial que as marcas tenham valores alinhados aos de seus públicos e que esses valores também sejam genuínos. É o que chamamos no mercado de “walk the talk”, não basta apenas discursar a favor de uma causa, é necessário atuar proativamente por ela. Definir um propósito de marca genuíno é um processo de dentro para fora, que começa já na cultura da empresa. A partir daí, podemos conectar o DNA da marca com as mensagens que vamos passar e a forma como vamos passá-las para o público.
No caso da Visa, a inclusão e a diversidade são parte do DNA e da cultura da empresa, e acreditamos que promover esses valores é essencial para o negócio. Trabalhamos esses valores em diversas iniciativas internas e externas, nos abrindo para escutar os grupos sub-representados, conhecer suas dores e objetivos e entender como podemos colaborar para que esses grupos prosperem. Além de ser uma forma de trabalhar a imagem institucional da marca, entremear esses valores na cultura da empresa facilita a comunicação deles em nossas campanhas e iniciativas de forma mais orgânica.
2) Quais desafios você enfrentou ao liderar o foco em inclusão e diversidade, e como você os superou?
O desafio que destaco é que, desde que entrei no mercado de trabalho até agora, muitas mudanças ocorreram, especialmente nas discussões sobre gênero, raça, pessoas com deficiência e a comunidade LGBTQIAPN+. O desafio é garantir que a definição de gênero, raça e todas as interseccionalidades não sejam barreiras para avançarmos e conquistarmos espaço.
Recomendo a leitura de “Ensinando a Transgredir”, de Bell Hooks. Neste livro, a autora aborda como a educação pode ser uma ferramenta para “transgredir” fronteiras raciais, sexuais e de classe. A contracapa do livro traz a frase: “a educação como prática da liberdade é um jeito de ensinar que qualquer um pode aprender”. Isso resume bem os desafios em inclusão e diversidade. Ao estudarmos, ampliamos nosso pensamento crítico, não aceitando um mundo desigual, especialmente para mulheres negras e pessoas trans.
3) Como a Visa mede o sucesso de suas estratégias de inclusão e diversidade? Quais métricas você considera mais importantes?
Combinamos diversas métricas qualitativas e quantitativas. Analisamos a diversidade do quadro de colaboradores, levando em conta a composição demográfica e aspectos como gênero e etnia. Dessa forma, ajustamos nossos programas de contratação inclusiva, como o programa de estágio com recorte racial e a contratação de pessoas com deficiência.
Também estabelecemos metas de inclusão e diversidade (I&D) direcionadas à liderança. Dentro das iniciativas de I&D, realizamos pesquisas de engajamento e satisfação dos colaboradores, que nos ajudam a medir a percepção interna sobre as iniciativas de diversidade e inclusão. A partir dessas escutas, traçamos boa parte da estratégia do comitê. Essas métricas combinadas oferecem uma visão abrangente do progresso da Visa em direção a um ambiente mais inclusivo e diversificado, permitindo ajustes e melhorias contínuas.
4) Em uma entrevista recente, você mencionou que diversidade, equidade e inclusão devem estar integradas ao negócio. Como você acredita que essas práticas impactam diretamente os resultados financeiros da Visa?
A atuação das empresas precisa e tem que ir além da esfera econômica, englobando também a parte social. Negócios que não apoiam causas importantes e ou atuam de forma conflitante com algumas pautas tendem a ter cada vez menos sucesso financeiro. Por isso, é importantíssimo integrar diversidade e inclusão ao negócio, movimento que a Visa faz e tem noção do impacto significativo nos resultados financeiros de várias maneiras. Uma empresa diversa e inclusiva traz mais inovação e criatividade.
Um grande exemplo de integração da diversidade e inclusão ao negócio e seu aspecto financeiro é o Visa Causas, uma iniciativa que permite aos portadores de cartões Visa contribuir para causas sociais cada vez que usam seu cartão. O programa facilita e incentiva a doação para organizações sem fins lucrativos e projetos sociais, colocando o consumidor no controle das nossas ações. A cada compra realizada com um cartão Visa, uma pequena porcentagem do valor ou uma quantia fixa é doada automaticamente para uma causa escolhida pelo usuário.
Em suma, a diversidade e inclusão nos negócios não é apenas uma questão ética ou moral, mas também uma estratégia importante de inovação. Os talentos que a empresa atrai e retém podem contribuir para entender mercados mais diversos, potencializando os resultados.
5) Você pode compartilhar alguns exemplos de como as iniciativas de Diversidade e Inclusão têm influenciado a cultura organizacional e a performance da Visa?
A aceitação e movimentação universal do dinheiro para todos, em todos os lugares, não é só nossa promessa de marca, mas a base da nossa cultura organizacional. Há cinco anos, criamos o nosso Comitê Interno de Inclusão & Diversidade, com o qual realizamos um trabalho de educação e conscientização sobre os temas que abrangem esta frente, além de diversas iniciativas internas para promover um ambiente de trabalho respeitoso e diverso.
Em 2022, firmamos uma parceria com a Indique, consultoria de Diversidade e Inclusão que conecta a comunidade negra ao mercado de trabalho, para criar o nosso primeiro programa de estágio exclusivo para pessoas negras. Os selecionados seguiram um plano de desenvolvimento que incluiu mentorias com um time de especialistas, e também receberam bolsa auxílio e bolsa de estudo para cursar inglês. Dois anos depois, todos(as) profissionais foram efetivados.
Também firmamos, em 2022, uma parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV) para um programa de bolsas de estudos para alunos(as) negros, contemplando ajuda de custo, curso de inglês e mentorias. Também integramos o movimento Mulher 360 e ONU Mulheres, onde empregamos uma filosofia global de equidade salarial e promovemos a qualificação em oratória para todas as mulheres, e contamos com um programa de mentoria.
6) Em sua opinião, quais são as principais barreiras que as empresas enfrentam ao implementar iniciativas de diversidade e inclusão? Como superá-las?
Tenho visto muitas matérias sobre o enfraquecimento do discurso de diversidade e inclusão no mercado corporativo, inclusive com organizações desfazendo seus setores dedicados às causas ESG. Acredito que isso vai muito de encontro à questão do walk the talk, que falei anteriormente. Defender os valores de inclusão e diversidade na estratégia de negócios não funciona a menos que esses valores sejam impregnados de forma genuína na base da cultura organizacional, a começar pela constituição das equipes e pela construção dos propósitos da empresa. Quando isso não é feito e o tema começa a “esfriar”, as iniciativas não se sustentam.
Uma das principais barreiras é a falta de apoio dentro da própria companhia. Felizmente, não é o caso da Visa, mas há locais onde as iniciativas de diversidade e inclusão são vistas de forma secundária. Essa situação está conectada a uma outra barreira bastante comum, que é a da falta de recursos – sejam eles orçamentários ou humanos – para viabilizar ideias e ações.
No que diz respeito à superação dessas barreiras, é necessário que haja um compromisso genuíno e contínuo de toda a organização, especialmente da liderança. Uma comunicação didática somada a ações de conscientização que envolvam todos os colaboradores e estrutura orçamentária adequada são fundamentais para criar um ambiente verdadeiramente inclusivo e diversificado em qualquer negócio.
7) No contexto do programa “Elas Prosperam”, que resultados você já observou em termos de capacitação e empoderamento de empreendedoras?
O Elas Prosperam promove ciclos de capacitação e mentoria para empreendedoras negras, com o objetivo de ajudá-las a impulsionar os seus negócios. Ao final de cada edição, cinco mulheres são selecionadas para ganhar um capital semente de R$10.000,00 para investir.
Mais do que capacitar empreendedoras negras, essa iniciativa é uma forma de empoderá-las, fazendo-as entender a importância de seus negócios para o desenvolvimento econômico de suas comunidades e do país como um todo. Por isso, além de aulas de finanças e gestão, elas também têm mentorias em temas como autoconhecimento e liderança, por exemplo. Em 2024, chegamos à 5a edição do Elas Prosperam. Desde 2020, já foram mais de 4500 empreendedoras inscritas e mais de 1000 mulheres impactadas.
É muito gratificante ver os resultados desse projeto. Como mencionei anteriormente, o propósito da Visa é ajudar pessoas a prosperarem, e o Elas Prosperam é uma forma de incentivar a inclusão financeira e o empoderamento de mulheres negras ao ajudá-las a criar negócios sustentáveis, seguros e eficientes, tornando-se também agentes de transformação na sociedade.
8) Como você vê o papel de eventos esportivos na promoção da diversidade e inclusão, especialmente em relação a parcerias como a da Visa com o Parabank?
O esporte faz parte do DNA da Visa. Acreditamos que ele tem o poder de unir diferentes grupos de pessoas em torno de uma paixão em comum, promovendo o espírito de comunidade e inspirando mudanças positivas na sociedade, e enxergamos esse poder como uma oportunidade para nos conectarmos com públicos diversos. Por isso, temos um histórico de décadas apoiando atletas, eventos e instituições em diversas modalidades.
Ao unir essa estratégia aos nossos valores de Inclusão e Diversidade, honramos nosso propósito e compromisso de elevar todas as pessoas, em todos os lugares. A Visa foi, por exemplo, o primeiro patrocinador global do Comitê Paralímpico Internacional, apoiando os Jogos Paralímpicos desde 2002. Também lançamos, em 2000, o programa Team Visa, que já apoiou mais de 600 atletas olímpicos e paralímpicos. Nos Jogos de Paris 2024, por exemplo, patrocinamos a paratleta brasileira Raissa Rocha. A seleção de atletas deste ano também é a mais diversa da história do programa, tendo alcançado a marca de 55% de atletas mulheres.
A parceria com o Parabank se alinha perfeitamente com esses valores da Visa. É um banco que foi criado por um ex-atleta paralímpico, pensado para atender as necessidades específicas do público PcD. Lançamos os cartões inéditos, com as versões físicas com funções táteis, por exemplo, e benefícios como parcerias com clínicas de reabilitação e um canal de marketplace com atendimento personalizado. Além disso, Visa e Parabank acreditam que a inclusão financeira é fundamental para promover a inclusão e a diversidade como um todo. Ao lançar um produto voltado especificamente para o público PcD, colaboramos com a inclusão de uma parcela da população que, muitas vezes, é excluída do sistema financeiro tradicional.
9) A pesquisa “Raça e Mercado” revelou insights importantes sobre empreendedores negros. Como você utiliza esses dados para informar as estratégias de marketing da Visa?
Na Visa, consideramos os dados ferramentas valiosas para orientar nossas decisões, identificar tendências e oportunidades. Diversas pesquisas mostram o potencial das micro e pequenas empresas para o desenvolvimento econômico e social. Por isso, investimos nesse mercado, desenvolvendo soluções voltadas para suas necessidades específicas.
No caso do projeto Raça e Mercado, o estudo encomendado pela PretaHub, apoiado pelo JPMorgan e realizado pelo Plano CDE, nos ajudou a compreender melhor o perfil das empreendedoras e empreendedores negros. Essa iniciativa reforça a ideia de ecossistema, onde diversas organizações de setores distintos, mas com o foco no empreendedor negro, desenvolvem projetos de apoio ao ecossistema. A pesquisa identificou três tipos principais de empreendedores:
1. Necessidade: Motivados a empreender por necessidade ou desemprego, com apoio de familiares e amigos. Muitos ainda não são formalizados, mas planejam se formalizar.
2. Vocação: Iniciam negócios pela familiaridade com a atividade e pelo desejo de autonomia. A maioria é formalizada como MEI para estabelecer contratos de prestação de serviços.
3. Engajados: Desejo de empreender combinado com a vontade de exercer uma atividade afirmativa voltada para o público negro. A maioria é formalizada como MEI e prioriza fornecedores negros, direcionando suas atividades ao público afro.
Há também um perfil misto que compartilha características dos três principais perfis. Essas informações são essenciais para decisões de negócios e para entender como colaborar com o desenvolvimento social, criando iniciativas como o programa Elas Prosperam. Ao conhecer os desafios enfrentados por empreendedoras negras no Brasil, como dificuldade de acesso a crédito e falta de conhecimento técnico de gestão, pudemos criar um programa que oferece as ferramentas necessárias para superá-los.
A melhor parte de fazer esta série é a oportunidade de conhecer pessoas tão incríveis. Espero que este conteúdo inspire boas ideias sobre a aplicação do ESG na sua empresa. Se você gostou, não se esqueça de compartilhar no LinkedIn e de curtir nosso post no @portaldoesg.
Para ter acesso a todas as entrevistas do “Vozes do ESG”, clique aqui.
Fernanda de Carvalho é Engenheira Florestal formada pela Universidade Federal de Viçosa (UFV) e Mestre em Ambiente, Sociedade e Desenvolvimento pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Também estudou na Technische Universität München, Alemanha, onde cursou disciplinas do Mestrado em Manejo de Recursos Sustentáveis com ênfase em Silvicultura e Manejo de Vida Selvagem. Dedicou parte da sua carreira a projetos de Educação Ambiental e pesquisas relacionadas à Celulose e Papel. Trabalhou com Restauração Florestal e Formação Ambiental na Suzano S/A e como Consultora de Comunicação da Ocyan S/A. É conhecida no setor florestal pelos artigos publicados nos blogs Mata Nativa e Manda lá Ciência.